O ano era 1968, quando ainda adolescente e menor de idade, deu à luz aos filhos gêmeos. Hoje relembra o período, marcado por muita angústia, no qual foi coagida a permitir o maior equívoco de sua vida, que a levou a conviver legalmente com os meninos como se fossem seus irmãos.
A confusão só foi resolvida passados 55 anos, com a realização de um exame de DNA e da tramitação do caso de reconhecimento de maternidade e anulação de registro civil, na 3ª Vara da Família da comarca de Joinville. Agora sim, consta no documento o nome da mãe biológica como deveria ser, ainda que não conste o pai, com a possibilidade de criar um vínculo nunca firmado entre eles.
Segundo as informações, a mãe teve um romance com um homem, já falecido, sem o consentimento dos pais, que resultou na gravidez. Ao dar a notícia, a família rejeitou e proibiu o contato com o então namorado, que naquele momento já se encontrava em outro relacionamento.
Desassistida e confusa, retornou à casa dos pais que lhe acolheram. Porém, na tentativa de “salvar a honra da família” e dar uma suposta dignidade aos netos, o pai decidiu que ele e a esposa assumiriam e declarariam a paternidade e maternidade de seus filhos, ou seja, registrariam os netos como filhos para que não sofressem o preconceito e humilhação de ter o pai desconhecido e ausente nos documentos, sem falar na vergonha e humilhação moral e religiosa.
A mulher relatou que a decisão não foi dela, mas deixada pelo namorado e diante da pressão psicológica e religiosa dos pais, acabou cedendo, visto que dependia financeiramente deles.
Logo os filhos tiveram conhecimento da realidade, mas isso em nada mudou a vontade em ser reconhecida oficialmente como mãe de direito (biológica) e por fim ao tormento que afligiu a vida: é mãe e não irmã dos gêmeos.
Desta forma, para definição do caso, todos – filhos e mãe – buscaram a justiça e anexaram ao processo os exames de DNA, com resultado que apontava a probabilidade de 99% dos laços sanguíneos entre as partes.
O magistrado, na sentença, explicou que o reconhecimento de filiação não prescreve e os avós maternos – já falecidos – praticaram ilegalidade no registro/adoção, um exercício até então conhecido como “adoção à brasileira”, quando se registra o filho de outra pessoa em seu nome, de forma a fugir das exigências legais pertinentes ao procedimento, sem as cautelas judiciais impostas pelo estado, necessárias à proteção especial que deve recair sobre os interesses da criança.
Ainda na decisão, o juiz afirma que a mãe biológica não pode ser penalizada pela conduta irrefletida dos pais (avós). Tal ato, confirmou o juiz, apenas poderia ser sanado com o manejo da presente ação.
“Mesmo que a parte requerente tenha sido acolhida em lar adotivo e usufruído de uma relação socioafetiva, nada lhe retira o direito em havendo insurgência ao tomar conhecimento real de sua história, de ter acesso à sua verdade biológica que lhe foi usurpada desde o nascimento até a idade madura. Assim tendo em vista o grau de eficiência do exame de DNA e as demais provas constantes nos autos, o pedido deve ser acolhido. Declaro que os gêmeos são filhos biológicos da requerente, deste modo determino a retificação dos registros de nascimentos com o nome da genitora e para que sejam suprimidos os nomes dos pais registrais”, determina.
O processo tramita em segredo de justiça.